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Fracasso e esperança (parte 1)

A operação Margem Protetora, iniciada por Israel em 8 de julho, tem seu objetivo declarado: fazer com que o Hamas e seus similares (Jihad Islâmica, Frente Popular para Libertação da Palestina, Comitês de Resistência Popular) sejam suficientemente enfraquecidos, a ponto de não mais atacar a população israelense – ao menos por algum tempo.

O termo mais popular para definir esse objetivo, constantemente ouvido de personagens políticos e militares israelenses, é “silêncio” ou “calmaria” (sheket em hebraico). No dia em que ordenou o início da última operação, o primeiro-ministro Bibi Netanyahu fez uma declaração ao povo, por meio dos canais de televisão, onde enfatizou:

“estamos agindo para (…) retornar ao silêncio, e continuaremos (…) até que o silêncio retorne”.

Desde a Segunda Intifada, ocorrida entre 2000 e 2005, os primeiros-ministros israelenses têm realizado sucessivas operações militares para combater o terrorismo palestino, sempre declarando estar em busca de “calma”. Em 2012, na operação Pilar de Defesa, o Ministro Yuval Steinitz citou a necessidade de “silenciar” Gaza. Na Operação Iemei Teshuvá (“Dias de Penitência”), empreendida pelas Forças de Defesa de Israel entre Setembro e Outubro de 2004, já se pretendia, segundo reportagem do jornal Haaretz,

“interromper o lançamento de mísseis Qassam à cidade de Sderot e à região do deserto do Neguev”.

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Entre 2004 e 2014, Gaza, o Hamas e os demais grupos terroristas palestinos foram alvo de 8 grandes operações militares israelenses, sendo que o propósito de todas envolveu a busca de “silêncio” e “calma”. Não há mais como evitar uma óbvia conclusão: Israel falhou em atingir seus objetivos. As estratégias empregadas fracassaram e seguirão fracassando. Afinal, a meta de 2004 continua sendo a meta de 2014; Grads e Qassams ainda voam em direção a Ashdod, Ashkelon e Beer Sheva. Após o fim da Margem Protetora, não esperaremos muito até ouvirmos novas sirenes, corrermos para abrigos e esperarmos o terrível som dos foguetes estourando nas redondezas. Então, como conseguir “calma” em definitivo?

O think-tank estadunidense RAND foi atrás dessa resposta. O RAND foi criado após a 2ª Guerra, inspirado no sucesso do Projeto Manhattan – que criou a primeira bomba atômica. Por lá passaram pensadores como John Nash, Henry Kissinger e Condoleezza Rice, e diz-se que lá iniciou-se a criação da Internet, dos satélites da NASA e dos computadores modernos.

Em 2008, no calor do embate entre os Estados Unidos e o grupo terrorista islâmico Al-Qaeda, pesquisadores do RAND se perguntaram: como acabar com grupos terroristas? Como esses grupos deixam de existir, ou deixam de praticar atos terroristas para atingir seus objetivos?

O RAND utilizou-se de métodos estatísticos, além de seu banco de dados com informações sobre 648 grupos terroristas que existiram no mundo entre 1968 e 2006. A pesquisa foi direcionada ao governo dos EUA, para orientá-lo a combater e vencer a Al Qaeda. Entre as diversas conclusões e descobertas do estudo de mais de 200 páginas, fica evidente como o contraterrorismo israelense seguirá falhando se mantiver sua política atual.

De acordo com o estudo, o fim de um grupo terrorista pode acontecer por 5 motivos:

  • pacificação e adesão ao processo político;
  • prisão ou morte dos membros do grupo por polícias ou agências de inteligência;
  • derrota frente a ofensiva (guerra) de exército nacional;
  • vitória ao atingir seus objetivos;
  • desagrupamento e adesão dos membros a outros grupos – neste caso os terroristas costumam seguir na ativa, o que o exclui como um fim para o terrorismo.

Os resultados são um (esperado) balde de água fria na estratégia israelense: em somente 7% dos casos a derrota em guerra, como a que Bibi realiza em Gaza, causou o fim do terrorismo. A pacificação é o fim mais freqüente (43%), seguido de perto pela atuação de polícias ou serviços secretos (40%). Nos demais 10%, os grupos enxergam seus objetivos cumpridos e encerram suas atividades.

O desfecho da operação Margem Protetora já é conhecido, pois assim foi desde o fim da Segunda Intifada: Gaza em ruínas, crianças do sul de Israel apavoradas pelas sirenes e pelo trauma, centenas de palestinos inocentes mortos, famílias israelenses chorando seus filhos perdidos em combate. Também veremos o Hamas declarando-se vitorioso, provavelmente ao mesmo tempo em que Bibi e seus ministros dirão que Gaza voltou ao “silêncio” e que Israel deu um forte golpe no terrorismo palestino. Até a próxima operação, a próxima ofensiva ou a próxima guerra.

As rotineiras tentativas de desmontar o aparato terrorista de Gaza, por meio de operações militares israelenses, falharam. Os foguetes chegando a Tel Aviv e Haifa comprovam que, apesar de empobrecido e isolado, o Hamas ampliou sua capacidade bélica e seu contingente. Entretanto, encerrar a análise por aqui não indicaria o caminho para que Israel veja-se, finalmente, envolto de “calma” e “silêncio”. Nos próximos artigos, nos aprofundaremos no estudo apresentado pelo RAND e no quanto Israel conseguiu – ou não – interromper o terrorismo palestino por cada um dos outros meios destacados – pacificação e processos políticos, ação policial e de inteligência.


P.S. – É problemático abordar o fim do terrorismo palestino sendo motivado pela sua vitória, tendo em vista que os diversos grupos possuem objetivos conflitantes e, às vezes, não claramente definidos. Tais objetivos variam desde um califado islâmico em toda a região, até um Estado palestino secular e democrático nas fronteiras de 1967. O Hamas declara em seu estatuto que busca erradicar o sionismo da Palestina e implantar um Estado fundamentalista islâmico; no entanto, seus líderes já se manifestaram a favor de uma solução de dois estados (veja aqui e aqui), ou seja, reconhecendo Israel. A Fatah, por outro lado, é um movimento secular que tem cooperado amplamente com Israel nos últimos anos. Finalmente, não passa pela cabeça de ninguém (são e consciente) a possibilidade de Israel deixar de existir, ou de os palestinos deixarem de buscar um Estado independente e soberano.


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