“A coexistência deve estar presente no modo como sentimos, pensamos e realizamos o nosso judaísmo”

No Brasil dos dias atuais, com manifestações, passeatas e uma população cada vez mais interessada em participar politicamente a questão da representação está cada vez mais complicada, e em alguns casos até perigoso. Aproveito para agradecer desde já a possibilidade e o desafio de representar a parcela jovem da comunidade judaica diante de todos vocês que acreditam no Diálogo e na Coexistência. Vou tentar dar voz a todos aqueles que trabalham para criar uma comunidade integrada com os ideais judaicos de TIKUN OLAM (transformação do mundo) e TIKUN ADAM (transformação do homem).

Como membro jovem da comunidade judaica do Rio de Janeiro sinto que é meu dever abranger a maior quantidade possível de aspectos que o judaísmo compreende. Contudo, não serei leviano em tentar definir a totalidade do judaísmo e também não permanecerei apenas com uma perspectiva judaica. Nesse sentido, optei por utilizar todo o sistema de pensamento judaico (religioso, cultural, social, e nacional) através da divisão do sentir, pensar e realizar.

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Representantes das religiões judaica, católica e muçulmana.

Peço a permissão de vocês para parafrasear Ghandi, e afirmar que: “O DIÁLOGO NÃO É UM OBJETIVO, O DIÁLOGO É O MEIO PARA ALCANÇAR O NOSSO OBJETIVO”. Assim como meus companheiros muçulmanos e católicos, nessa jornada que começa com esse evento, me comprometo com essa ideia e com as mais profundas consequências dessa mensagem. A COEXISTÊNCIA deve estar presente no modo como sentimos, pensamos e realizamos o nosso judaísmo.

Para amparar o nosso sentimento contamos com as ideias de Martin Buber – um grande orientador (madrich) para todos aqueles que priorizam a relação e o relacionamento. Para Buber a união e a fusão da relação EU-TU não pode ser totalizada por mim, e não pode ser efetivada sem mim. O amor é a única forma de se relacionar que pode compreender a totalidade do ser, de mim e do outro. Dessa maneira, o sentir deve estar presente em todos os encontros que formam a vida, e só sentiremos o outro a partir de uma relação de compaixão. Jesus professou uma mensagem semelhante séculos antes.

Para direcionar o nosso pensar, podemos contar com a experiência do Rabino Abraham Joschua Heschel. Além de uma trajetória de vida apaixonante, Heschel nos ensina que a oração é a forma de aproximar o humano do transcendental, aproximando-o do mistério que é o âmbito sublime do mundo. A oração legítima para Heschel, pode ser entendida como um pensamento direcionando à encarar a unicidade de Deus no mundo. Nesse sentido, o homem, ao direcionar seu pensamento, se insere no mundo em que vivemos e se conecta com o âmbito transcendental. O Corão nos ensina que a única passagem vivenciada integralmente por Mohamad é a sua viagem até a mesquita Al-Aqsa, em Jerusalém, na qual ascendeu aos céus para receber a orientação da oração. A oração aparece então como uma ponte entre nossas religiões.

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Michel Gherman e jovens representantes das três religiões.

Volto aos conceitos de TIKUN OLAM (transformação do mundo) e TIKUN ADAM (transformação do homem) para enaltecer o valor da luta pela realização dos ideais de todos os jovens aqui presentes. A comunidade judaica do Rio de Janeiro já pratica uma série de atividades em conjunto com outras religiões, outras comunidades, e pessoas com diferentes realidades sociais na busca por uma transformação do mundo. Quaisquer exemplos citados aqui não esgotarão todas as iniciativas da nossa comunidade.

A certeza que o sol renascerá amanhã, e com ele nossa mente acordará sob os auspícios do racionalismo e dos grilhões da vida cotidiana, impede que o mistério da subjetividade nos envolva. Porém, nós temos a sorte de morar no Rio de Janeiro. Nessa cidade, um simples trajeto de ônibus mostra a beleza de uma natureza sem fim conjugada com a riqueza e a pobreza lado a lado no mesmo cenário. A partir dessa realidade temos a obrigação de lutar por alguns objetivos como o fim do preconceito religioso e da desigualdade social, demandar uma estrutura urbana de qualidade e que não haja destruição da natura que compõe a nossa cidade. Iniciativas com esse objetivo também nos conectam com a religião, seja o judaísmo, o catolicismo, ou o islamismo. A comunidade judaica já se move nessa direção.

Gostaria de dar especial destaque aos programas das escolas Eliezer Steinbarg Max Nordau, A. Liessin Sholem Alechem, do centro universitário Hillel Rio, e dos movimentos juvenis Bnei Hakiva, Chazit Hanoar, Habonim Dror e Hashomer Hatzair. Todas essas instituições trabalham para formar a identidade daqueles que serão os próximos líderes e ativistas da comunidade judaica, para conscientizá-los que vivemos num único mundo, e que a COEXISTÊNCIA é o caminho. Através de iniciativas como o “Tzedek(justiça)” do Hillel, “Vizinhos de Portas Abertas do colégio A. Liessin, do “Bnei Maavar (filhos da passagem)” do Eliezer Max, da “Chaverim ( amigos)” da Chazit Hanoar, “Conexão do Bem” do Habonim Dror, as crianças e os jovens da comunidade judaica entendem que apenas ajudando ao próximo é possível construir um mundo mais justo.

Para finalizar, gostaria de agradecer a todos que me concederam a oportunidade de estar aqui hoje. Reafirmo que esse evento é apenas o primeiro de uma jornada local da juventude em direção à uma sociedade livre de preconceitos e integrada ao redor de um objetivo comum – a transformação do mundo – começando pela nossa comunidade carioca. Como será essa transformação, nós iremos pensar juntos. Para onde queremos seguir, nós iremos decidir juntos. Há apenas um elemento que não podemos nos desfazer, o DIÁLOGO COMO IGUAIS.

Discurso proferrido por Rodrigo Baumworcel no “Encontro Inter-Religioso entre Católicos, Judeus e Muçulmanos”.

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