Egito: o que está acontecendo?

Na última quarta feira, dia 14 de Agosto, o Egito deixou o mundo em choque. O país está em período de transição desde Janeiro de 2011, quando começaram as manifestações que levaram à renúncia de Hosni Mubarak. Mubarak manteve um governo altamente autoritário com duração de mais de três décadas.

Após um governo de transição liderado pelo exército, há cerca de um ano o país elegeu seu primeiro presidente eleito. Membro da Irmandade Muçulmana, Mohammed Morsi permaneceu como presidente do Egito até o dia 03 de Julho de 2013. Ao longo de seu relativamente curto governo, Morsi enfrentou uma séria oposição composta por liberais, seculares e esquerdistas.  Desde sua eleição, as manifestações por um governo que atendesse às demandas sociais e econômicas do Egito continuaram. O presidente deposto foi acusado de prosseguir com o autoritarismo de seu antecessor.

No dia 30 de Junho deste ano, para marcar o primeiro aniversário de Morsi no governo, milhões de civis tomaram às ruas do Cairo em protesto aos rumos da presidência. A manifestação foi organizada pelo Movimento Tamarod. Na ocasião, os manifestantes incitaram o exército a dar um ultimato para o presidente Morsi, avisando que se ele não viesse a cumprir as demandas econômicas e sociais em até 48 horas, as forças armadas iriam intervir e instaurar seu próprio plano de governo. A resposta de Morsi foi de que sua presidência era legítima e que qualquer medida que o levasse a renunciar à força acabaria conduzindo o país ao caos.

Manifestação contra Morsi: “Somente palavras”

Manifestação contra Morsi: “Somente palavras”

Morsi foi deposto pelas forças armadas no dia 3 de Julho, quando o General Abdul Fattah al-Sisi declarou que a constituição do país estava suspensa. O Chefe da Justiça Adly Mansour ficou responsável por assumir o governo de transição, que deveria se manter até que fossem realizadas eleição residencial e parlamentar. O vice-presidente nomeado foi Mohamed ElBaradei, figura de destaque da oposição. Desde então, o Egito ficou dividido entre os apoiadores de Mohammed Morsi e seus opositores.

Na última quarta feira, dia 14 de Agosto, o Egito enfrentou o que o Primeiro Ministro da Turquia chamou de um “massacre muito sério”.  As forças armadas do governo de transição invadiram dois acampamentos de protestos a favor de Morsi, utilizando gás lacrimogêneo e armas de fogo para dispersar os manifestantes. Tanques blindados também fizeram parte da operação.

Os acampamentos se localizavam próximos ao Cairo, na mesquita Rabaa al-Adawiya e na Praça Nahda ao oeste da cidade. Segundo o Ministério da Saúde, foram cerca de 3700 feridos e 525 mortos. A Irmandade Muçulmana, principal apoiadora da legitimidade de Morsi, afirma que o número de assassinados é superior a dois mil. O Ministério da Saúde declarou que em seus relatórios só constam o número de corpos que passaram pelos hospitais púbicos.

Cartaz a favor de Morsi: “Sim à legitimidade. Não ao golpe”

Cartaz a favor de Morsi: “Sim à legitimidade. Não ao golpe”

Na manhã de quinta, dia 15 de Agosto, a Irmandade Muçulmana convocou a população para marchar contra a ação das forças armadas do dia anterior, tanto no Cairo quanto em Alexandria. Os manifestantes invadiram o prédio que sedia o governo em Giza, incendiando as instalações. Após algumas horas, foram rechaçados pela polícia.

O vice-presidente do governo de transição, ElBaradei, renunciou na quarta feira em oposição às ações das forças armadas. Os Estados Unidos, assim como outros governos, condenou a intervenção militar do dia 14 de Agosto e anunciou que as operações militares conjuntas com o Egito previstas para Setembro estão canceladas. Tayyip Erdoğan, o Primeiro Ministro da Turquia, pediu que o Conselho de Segurança das Nações Unidas se reúna rapidamente para tomar alguma atitude em relação à violência no país.

Desde as manifestações de Janeiro de 2011, o Egito enfrenta seu momento mais sangrento. O mundo tem reportado as notícias que acontecem a cada momento no país e sobre ele, mas análises sobre o futuro são complicadas de serem realizadas. Desde Janeiro de 2011, ainda, através de manifestações, a população conseguiu depor um governo autocrático, votar para presidente, tirar do poder o governante eleito por insatisfação e lutar contra o governo de transição atual. Ainda em Janeiro de 2011, a população se encontrava bastante diversificada na Praça Tahrir: homens, mulheres, islamistas, seculares, jovens, estudantes e mais. Eles tinham um objetivo comum, porém pouco detalhado: ua liderança democrática e justa para a população. Hoje, o Egito está dividido. Os interesses de cada grupo estão cada vez mais entrando em confronto, o que não é algo de simples análise em um país com uma população superior à 82 milhões de pessoas, em uma sociedade altamente estratificada social, religiosa e economicamente.

Texto publicado originalmente no blog Middle East Talks … vamos bater um papo sobre Oriente Médio?.

Este e outros textos da autora podem ser conferidos em http://orientemediohoje.com/

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